sábado, 13 de junho de 2015

NÃO É PLÍNIO MARCOS

foto Camila Sérgio
 por José Manoel Sobrinho

Acostumei-me, durante minha infância no Sítio Serra dos Bois, em Bezerros, Agreste de Pernambuco a assistir madrugada adentro as Cantorias de Pé de Parede. Nestas cantorias o que mais me impressionava era a quantidade de motes que o povo escrevia, colocava nas cuias ou chapéus juntamente com cédulas curtas ou moedas e que, de imediato, eram improvisados pelos cantadores. Uma maestria, coisa de gênio, habilidade que me deixava impactado. Nunca consegui improvisar assim, fazia motes ingênuos e românticos, pouco provocativos, pouco criativos. Desisti rápido. Mas aquilo ficou na minha memória para sempre. Mais, ainda, a vontade de improvisar. Talvez por isso anos depois eu tenha me transformado em professor da disciplina Improvisação para o Teatro, nos Cursos de Teatro do Sesc - Serviço Social do Comércio, e no Curso Básico à Formação do Ator, da Fundação Joaquim Nabuco - Fundaj, em Pernambuco e seja um atento leitor da pesquisadora Viola Spolin.

Com o SISTEMA 25, resguardando-se as diferenças culturais e temáticas, tudo foi muito parecido, os motes eram retirados da obra de Plínio Marcos, dramaturgo de São Paulo e, a partir desses motes, na sala de ensaio as cenas foram sendo escritas:

“Eram vinte e cinco homens empilhados, espremidos, esmagados de corpo e alma, num cubículo imundo onde mal caberiam oito pessoas.”

“Eram vinte e cinco homens colocados no imundo cubículo para morrer. Para morrer aos poucos. Para morrer de forma que parecesse natural.”

“Para morrer sem estremecer as relações internacionais dos cidadãos contribuintes.”

Com este tema na cabeça e as ideias promovidas pelos motes, iniciamos o processo de trabalho. Vale aqui lembrar que durante anos eu estive como artista e gestor cultural envolvido na realização dos Projetos Alvará de Expressão e Coringa, uma ação colegiada do Governo de Pernambuco (gestão Miguel Arraes de Alencar) juntamente com a Federação do Teatro de Pernambuco - Feteape, e aportes dos Ministérios da Justiça e Cultura, e que a questão do Sistema Penitenciário sempre esteve presente nas abordagens de meu trabalho. No começo deste processo o desejo era de retomar o tema em consequência das graves crises, porque passa o modelo de gestão do sistema prisional brasileiro e suas casas de fazer criminosos. Não se faz educação por metro quadrado, muito menos com pessoas entulhadas em restos de espaços destinados mais à morte do que à vida.

Quem agora assistir ao espetáculo vai perceber que houve um desvio de intenção, porque não é deste tema que trata o SISTEMA 25 e sim da condição de vida extrema e de como qualquer pessoa, independente de estar encarcerado no sistema prisional, desequilibra-se diante de uma vida sem perspectiva. A desordem e o caos constituem outros SISTEMAS para além das cadeias e presídios.

Mas, voltando ao processo...
Nos últimos tempos me reaproximei dos Motes de minhas memórias afetivas quando da realização das Jornadas Literárias Portal do Sertão e Chapada do Araripe, projetos do Sesc Pernambuco que eu criei e coordeno, especialmente quando Cida Pedrosa e Sennor Ramos, curadores das Jornadas, começaram a inserir na programação as Mesas de Glosa, espaços de expertise, desafios que são genialmente vencidos por glosadores exímios, homens e mulheres dotados de excepcional capacidade criativa. Em outra dimensão, ouvir Zé Brown e Júnior Baladeira, mestres do Rap, com suas habilidades de improviso também me serviram de referência e inspiração para conduzir os ensaios que geraram o nosso espetáculo. Mas, atenção, esteticamente não há nenhuma aproximação entre estas tendências da arte, elas serviram de estímulo para a minha condução do processo, na minha solidão criativa.

Conheço a obra de Plínio Marcos, “o poeta do submundo, o dramaturgo maldito ou simplesmente, o repórter de um tempo mau...”, dirigi nos anos 90 o seu Jesus Homem, assisti a muitas montagens de seus textos para o teatro, também conheço o seu livro Inútil Canto e Inútil Pranto pelos Anjos Caídos, ficando particularmente aficionado pelo conto Em Osasco, sobre homens presos em uma cela de pequenas proporções, seus dissabores e desesperos e sobre seu estado limite de convivência e de desumanidade. Este foi o nosso ponto de partida, a “Cena da Origem”. Do conto Em Osasco identificamos os nossos Motes para a série de improvisos de onde emergiriam as cenas, suas personagens e posteriormente os discursos, os textos dramáticos.

Por aproximadamente 12 meses mergulhamos nas dores e odores destes homens, testosteronas agitadas, pulsações firmes, oscilações da alma, inteligências provocadas de onde muita arte surgiu. No espetáculo, agora em pé, pouco mais de 30% de tudo o que foi criado nos laboratórios de experimentação é que está em cena. Os outros 70% ficaram na memória de seus criadores, nos registros e rabiscos guardados em algum caderno de anotação ou se perderam na vastidão das subjetividades.

foto Camila Sérgio
Estrutura do Espetáculo 
Cenas por ordem de acontecimento no palco
Cena 1 – Prólogo – Cela. Música, Hino de Pernambuco (1908), letra de Oscar Brandão da Rocha e música de Nicolino Milano. Dramaturgia de José Manoel Sobrinho.
Cena 2 – Anunciação, dramaturgia de Will Cruz.
Cena 3 – O Guarda-Chuva, sobre mote de Plínio Marcos, dramaturgia de Samuel Bennaton. Música Alma, letra e melodia de André Filho.
Cena 4 – Cena Intermitente, dramaturgia de Samuel Bennaton.
Cena 5 – As Pragas da Pele e da Mente, sobre mote de Plínio Marcos, dramaturgia coletiva.
Cena 6 – O Carrasco, dramaturgia de Geraldo Cosmo e Beto Nery.
Cena 7 – Confissão, sobre mote de Plínio Marcos, dramaturgia de José Manoel Sobrinho.
Cena 8 – Mercado Aberto, 1ª parte, dramaturgia de presos brasileiros, anônimos.
Cena 9 - Ensaio Sobre o Amor, dramaturgia de Emanuel David D’Lúcard.
Cena 10 – O Homem Deus, dramaturgia de Marcílio Moraes.
Cena 11 – O Bloco, dramaturgia coletiva.
Cena 12 - Mercado Aberto, 2ª parte, dramaturgia de presos brasileiros, anônimos.
Cena 13 – Um Nuevo Tango, dramaturgia de Bruno Britto, Robson Queiróz e Emanuel David D’Lúcard. Música Tenho que te amar, de Geraldo Maia, com letra de Emanuel David D’Lúcard.
Cena 14 – Cartas: Inútil Espera, dramaturgia de Breno Fittipaldi e José Manoel Sobrinho. Música Amor Partido, de Eduardo Espinhara, Thyago Ribeiro e Romildo Luis.
Cena 15 – Alvará de Soltura, dramaturgia de Cláudio Siqueira e José Manoel Sobrinho.
Cena 16 – Reduto, dramaturgia de Marcílio Moraes.
Cena 18 – Patriota, (cena ainda inacabada) sobre tema proposto por Billé Ares.
Cena 18 - Códigos, dramaturgia de Emanuel David D’Lúcard.
Cena 19 – Ensaio Sobre a Força, dramaturgia de Emanuel David D’Lúcard. Música O Tempo, de Eduardo Espinhara, Thyago Ribeiro e Romildo Luis.
Cena 20 – Dama de Copas, dramaturgia de Edinaldo Ribeiro.
Cena 21 – O Amante de Carminha, dramaturgia de Eddie Monteiro e Will Cruz.
Cena 22 – Tatuagem, dramaturgia de Will Cruz e Edinaldo Ribeiro.
Cena 23 – Segredos da Bíblia, dramaturgia de Neemias Dinarte e José Manoel Sobrinho.
Cena 24 – O Sapato, dramaturgia de Eddie Monteiro, Will Cruz e José Manoel Sobrinho.
Cena 25 – Ensaio Sobre a Dor, dramaturgia de Emanuel David D’Lúcard.
Cena 26 – La Libertad, dramaturgia de Marcílio Moraes, sobre mote de Plínio Marcos. Música O Fogo, letra e melodia de André Filho.
Cena 27 – O Fogo, dramaturgia coletiva.
Cena 28 – Anjo Incestuoso, dramaturgia de Marcílio Moraes, sobre mote de Plínio Marcos, música Anjo Vindouro, de Geraldo Maia, letra de Marcílio Moraes.

Cena 29 – Zat – Zona Autônoma Temporária, 1ª parte, dramaturgia de Samuel Bennaton.
Cena 30 – Epílogo - Zat – Zona Autônoma Temporária, 2ª parte, dramaturgia de Samuel Bennaton. Música, Hino de Pernambuco (1908), letra de Oscar Brandão da Rocha e música de Nicolino Milano.
A articulação dessas dramaturgias foi realizada por todo o elenco, com participações relevantes de Emanuel David D’Lúcard, Samuel Bennaton, Will Cruz, Eddie Monteiro, Breno Fittipaldi, Neemias Dinarte, Beto Nery, Robson Queiróz, Bruno Britto e José Manoel Sobrinho. Organização de José Manoel Sobrinho.

terça-feira, 9 de junho de 2015

As Dificuldades para Assistir ao Sistema 25

foto Camila Sérgio
As curtas temporadas realizadas pelo espetáculo Sistema 25 têm gerado questionamentos quanto à dificuldade para ser ter acesso à informação, mais precisamente para se conseguir um ingresso que permita o acesso ao Teatro. Pois bem, se é difícil para o público, mais difícil é ter o espetáculo e não conseguir apresentar.
Vejamos os motivos:
- Primeiro não tem teatro disponível, principalmente pela configuração atípica do espaço cênico;
- Segundo, os espaços mais alternativos tem a possibilidade de ocupação, mas as estruturas de iluminação são incompatíveis com o projeto criado por Luciana Raposo, exigindo locação de equipamentos;
- Terceiro, esta é uma montagem realizada sem nenhum tipo de patrocínio e as despesas necessitam ser cobertas e, como são apenas 25 espectadores as receitas de bilheteria são insuficientes para cobrir as despesas com pagamentos de pautas e locações de equipamentos aumentando o tamanho do desafio que é manter a peça em cartaz;
- Quarto, sendo um espetáculo com 25 atores e 6 técnicos é um desafio espetacular articular as agendas.
Por isso pedimos desculpas e nos comprometemos a articular novas temporadas e comunicar nos veículos de comunicação priorizando as solicitações.
Finalmente, informamos que ESTÃO ESGOTADAS as 9 sessões previstas para esta Temporada de Processo Nº 2, no período de 6 a 14 de junho e que teremos Novas Temporadas nos dias 3, 4 e 5 de julho, 31 de julho, 1 e 2 de agosto, em locais a serem confirmados.
José Manoel Sobrinho